
31 outubro 2021
não se importam e não pedem perdão
assim tão semi
Sobre mim, sobre você
21 outubro 2021
O ouriço
Detesto me lembrar de você. Para que me lembrar de
você? Por que eu preciso passar essa raiva de saber que já te amei e que você
não vale nada. E que eu valia menos ainda pra você... — tudo isso que eu tanto
demorei pra ver.
Que asco que eu tenho de adivinhar o teu sorrisinho
vitorioso quando souber que eu me sinto assim... Que ódio em pensar que você
vai se satisfazer ao saber que eu sou o estrago que você fez... Que eu só fui
mais uma moeda a engordar o seu extrato. Que eu fui uma engrenagem — em meio a
tantas outras — a acelerar as tuas engenharias.
Você se diverte por ter me deixado assim? Você está
achando bom saber que você deixou alguém sentindo por você total desprezo e
nojo? Você vem me dizer que “se eu penso tanto em você é porque no fundo eu te
dou valor”? Que valor é esse?! Você se orgulha de causar dor em alguém? Que
tipo de gente você é que aprecia o sofrimento que causou?
No seu lugar, eu morreria de vergonha. No seu lugar,
eu me questionaria sobre todas as minhas atitudes e repensaria o tipo de pessoa
que eu estava sendo. Eu assumiria a minha responsabilidade sobre o estrago que
fiz sobre o outro e olharia com todo o cuidado o impacto que gero em alguém. Eu
me desculparia com toda a humildade que me fosse possível expressar e faria por
onde dar alguma reparação. E depois me esforçaria com tudo que tenho à mão para
evitar esse tipo de irresponsabilidade se repetir de minha parte. E isso seria o mínimo que eu poderia fazer.
O mínimo!
É engraçado como detestar alguém dá um certo gosto
quando a gente se pega assim xingando, diminuindo e desprezando essa pessoa... Tem
alguma coisa saborosa por nos vermos então, pelo menos assim, acima desse lixo
detestado. Dá um certo prazer em cuspir sobre o nome dessa miséria.
Mas chega uma hora que detestar cansa. Xingar,
diminuir, desprezar cansa. Cansa sentir raiva. Cansa a repetição desse enjoo.
Cansa se lembrar de novo e de novo e de novo do prejuízo, do tempo perdido, do mal
sofrido. Cansa se perceber que mais uma vez está se lembrando de tudo isso, mais
uma vez.
Ah, mas por que eu não simplesmente esqueço essa
merda? Seria tão mais fácil perdoar, deixar pra trás! Mas não.
A mágoa é como um cacto-ouriço que você me enfiou no
bolso da calça e perfurou toda minha perna, encheu minha roupa de espinhos e
ainda as minhas mãos quando eu tentei tirar o próprio ouriço do bolso e tive
que pinçar cada um, um a um, todos os outros espinhos espalhados: tanto da
perna quanto das pontas dos dedos e de cada outra parte do corpo onde esse
cacto encostou. E depois de tudo isso, o cacto ainda fica de herança, se não
mais para levar no bolso, que é insuportável, levar na bolsa. E depois, ao se
livrar dessa bolsa e assim finalmente do cacto, ainda fica a lembrança.
A lembrança da dor dos espinhos e do trabalho de
catar um a um, a raiva de saber que foi tanto tempo perdido nisso, do sangue
diluído em lágrimas, das feridas que ficaram, das infecções que aparecerem e
tiveram que ser tratadas, as inflamações que se espalharam... Essas lembranças!
E depois que toda essa parte que dói ter diminuído... vem as coceiras e
hipersensibilidades das cicatrizes.... os cuidados para essas áreas não serem
feridas de novo e tudo o que a gente gasta de esforço, tempo e até dinheiro para
fazer isso sarar logo e essa merda toda nunca mais acontecer de novo.
E o quanto cansamos também os outros ao nosso redor.
A paciência e persistência que eles têm de ter conosco até essa nossa dor
passar... antes que o amor deles acabe.
É... não se detesta alguém tanto assim à toa... E
saber disso não deixa tudo isso menos cansativo. Se eu penso em você, ainda,
depois de tanto tempo, é porque um dia já te dei muito, realmente, muito valor.
Um dia... mas já se foi. A partir de hoje, eu sou o teu ouriço.
17 outubro 2021
Teu podium
16 outubro 2021
O teu passa tempo
Como nos seus moldes eu me encaixo.
Ao perceber que de mim se ocupou
07 agosto 2021
Prece
me faz ver o feio, o falso e os cadafalsos
me cura desse olfato fraco
me deixa sentir de longe o chorume, as chorumelas e os chauvinismos
me cura do mau do bem
de viver se fudendo, de viver se doando
27 julho 2021
Dormir e esquecer
- desses que a gente acordado sonha -
e é filha dos pesadelos vividos
- desses que a gente sonha nunca viver
mas vive,
deles não acorda
e de cima nem de dentro não sai,
mesmo a gente dizendo pra ela ir embora
dormir e esquecer
dormir e esquecer
dormir e esquecer.
de falar e repetir
de repetir e remoer
de remoer e ruminar
de ruminar e relembrar
daquele lugar e daquele momento que já estamos
exaustos, enjoados e viciados em revisitar:
os nós em nós mesmos,
os orgulhos idiotas e defensivos,
os socos que queria ter dado,
e todos os chutes e tapas,
alguns com juros e outros tantos gratuitamente
Ela não se cansa de nos cansar e sugar e caçar
sempre atrás, sempre aqui, sem sair
nem de cima, nem de trás, nem de dentro,
dormir e esquecer
dormir e esquecer
só isso, pelo menos isso,
12 julho 2021
Os girassóis já morreram
Os girassóis já morreram
Já não mais giram
E o sol de leste a oeste segue.
As sementes pelo solo se espalharam.
A chuva um dia vem.
Antes de morrer, semearam.
Viverão.
11 janeiro 2021
Estupor
Não estou imune a seus efeitos:
Brinquedos pútridos cheirando a gala
Há tanto tempo que eu trafego
Com essas blindagens grossas feitas de não:
(“Não há mal nenhum”; “Não passa de uma brincadeira”; “Não estou te usando”)
Não preciso de ajuda
Há tanto peso que eu desprezo:
O teu estupro sobre minha pequena boca
(Reforçada a calar, afinal, é feio falar de boca cheia...)
E o meu estupor sob minhas largas retinas serradas
Vertendo hemorragia sob minhas pálpebras em comportas cerradas
O que me deixou por tantos anos largado
Alargado tateando solo uma solução:
A dissolução dos teus efeitos, do que trafego e do que desprezo.
E eu sei:
Você não está imune à minha causa.
Você sabe e eu sei.