...
O silêncio...
...a fala em potência.
Ouvir na reticência
o dizer no que não se diz.
Ouve o meu silêncio!
Atenta ao que não te digo!
Decifra quando paro e me calo!
Veja:
É porque tenho ouvidos
já cansados...
Das tuas palavras em excesso
Das tuas palavras em excesso repetidas
Das tuas palavras em excesso repetidas prolixas
Das tuas palavras em excesso repetidas prolixas vazias
...cheias de ti.

20 setembro 2013
04 agosto 2013
O meu olhar é embaçado como o que eu digo
O meu olhar é embaçado como o que eu digo.
Não vejo com os olhos, vejo com a língua.
E o que vejo a cada momento
É aquilo que antes eu já tinha previsto,
E me dou por isso muito mal.
Sei ser um tolo essencial
Como uma criança que, ao falar,
Não percebesse o que dissera deveras...
Sinto-me perdido a cada momento
Nos emaranhados embolorados do meu crânio
Creio nos meus devaneios como num pesadelo,
Porque os sinto.
E incomodado tento à toa não pensá-los
Porque sentir é o que os vivos sabem de melhor fazer...
Os pesadelos não se fazem para pensarmos neles
(Sonhar é flagrar o Desejo e o Medo transando)
Mas para vivermos eles e chorando sermos acordados...
Eu não tenho sentidos: tenho devaneios excessivos...
Se falo de tantos quereres e terrores não é porque tenha todos eles vivido,
Mas porque os sonho, e os sinto aqui estralando entre os meus ossos
Porque quem sonha nunca sabe direito porque sonha
Nem lembra tudo o que sonhou, nem o que é sonhar
Sonhar é uma infinita carência
E a última carência é não sonhar
Flerte
I
Sua pele então beijada me silencia
Estou nas sutilezas de dizer e não dizer
Eu me faço no revelar sem mostrar
Sou o bobo bem me quer mal me quer...
Meu bem não me quer?
Olha, pergunta, sorri
Quer
E te quero... e que ainda nem conheço!
E temo perder... o que ainda nem tenho!
E temo perder... o que ainda nem tenho!
Dou o movimento...
Jogo tenso, um empurra e puxa, trocas de olhar.
Jogo tenso, um empurra e puxa, trocas de olhar.
O
olhar projetado enquanto se recua, e então se encara...
...aprofunda-se íris adentro.
As
retinas, cortinas em contraluz, mostram em sombras quem está por dentro.
E
assim sorrisos entrevistos, visadas entressorridas no flerte,
desferindo palavras agudas,
perfumados floretes.
Dois a se confundir, um par a se olhar...
Dois a se confundir, um par a se olhar...
II
Não, eu não sei disfarçar.
Há coisas que me escapam
pelos poros
pelos olhos
pelos passos
pelos pensamentos... infindos balões imaginários,
Mais um ali passando!
Vê?!
O que me escapa?
Algo do que se queira dizer
Do que se queira
entregar
Do que se queira fazer...
Vê?!
Lá estou, disfarçadamente,
a te olhar...
22 julho 2013
Um estranho problema de repetição
Um estranho problema de repetição
é se ver outro nos mesmos lugares e situações. É se ver estranho às coisas ao
redor que antes eram tão comuns. E então pouco se suporta: é difícil aceitar o
mundo parado enquanto você em pleno movimento. Repetição de falas, repetição de
caras, repetição de fatos, mas que não mais ressoam em você, simplesmente
passam e quase matam... de tédio. Tédio, então cansaço, então enfado, então
sono. E você vibrando fortemente em outro tom, afinado com outras vozes, vendo
outras coisas naquelas mesmas coisas ainda as mesmas.
Você olha pro teto, procura uma saída, olha pros lados,
não vê opção. Finge que ouve, se põe civilizado, quando de fato o que queria
era mandar tudo pra merda, ou seja, tudo pro seu devido lugar: esse passado não
passa da merda que você caga e descarga, lava as mãos e vai embora.
Ir
embora, sempre indo, não parando e você vai sempre se fazendo estranho aos
mesmos mesmos nesse estranho problema de repetição.
17 julho 2013
09 julho 2013
in memoriam
Mecanicamente
eles repetiam:
“Bem-aventurados
os que promovem a paz,
Palavras do
Senhor, Graças a Deus...”
E saindo do
templo já se iam
Brigando entre
si, brincando de deus.
E não
satisfeitos com o poder outorgado,
Criavam mais
regras e bulas papais,
Criando mais
guerras e cada vez mais
Fazendo do
povo um mero seu gado.
Até hoje o
fazem, sem pena nem dó.
Há tantos mil’anos há tantos estragos,
há tantos
destratos, há tantos enganos,
que não se
estranha que o rebanho ande magro
e que o
santuário junte tanto mais pó.
Umbelino Neto,
à "Velhice do Padre Eterno, 1885"
08 julho 2013
“Fica?”
Deles
sobraram lembranças e fantasias do que foi e do que podia ainda ser: uma transa
naquelas escadas escuras do hotel, para o estupor de um transeunte desavisado.
Conversa sensual, palavras instigantes, aventuras verbais. Momento intenso, mas
fugaz. Intensidade da pressão que o relógio fazia anunciando o nascer do sol:
acabaria por ali, não havia muito tempo. Deveriam sorver cada segundo daqueles
beijos, inspirar cada centímetro daqueles toques. Olhar cada brilho de cada
olhar: olhar raso nas curvas da juventude de cada um, olhar fundo nas palavras
de seus porquês. Enfim ali se conheceram um pouco, enfim ali um tanto se
alegraram. E o dia findou antes que o sol nascesse.
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