17 julho 2022

Necromancia de transmutação pt. 3

ouviu-se um choro
um choro desarmônico
um choro desafinado
um choro chorado 
de soluçar num ritmo pesado
despreparado, desacostumado ao sentir
um choro de quem não sabe chorar
um choro de quem só chorou
no dia quando foi parido
e de que depois
só se ouviram gritos

de fome, de raiva, de sono, de colo, de sede, de dor
e de solidão
principalmente os berros de solidão

gritos apontados numa só direção
a de falsos espelhos
de pesadelos inventados pela manipulação
gritos de quem tem pressa
porque tem fome
gritos de quem alimenta a própria sede de sangue
e nunca se sacia porque nunca come 
o que realmente é importante
e assim segue sempre muito puto e... 
que ironia! 
muito obediente

capacho, fantoche, pisado e controlado
tratado na base de ossos descarnados 
e de deboche
mercenário barato
carniceiro feito barata
assustadiço, sorrateiro
monstrinho que corre pelos cantos
um vale nada

no fundo sempre foi um cego coitado
revoltado sem saber o porquê

taí todo o porquê
você é um garanhão usado como reles burro de carga
magro, sedento, irritado
porque nunca te nutriam como você precisaria
mas eu te falo
aqui no meu time
não tem destrato
aqui tem tempero
tem mistura
tem substância
aqui o papo é reto
tem sexo, rock e lambança
tem cafuné ou mordidas vampirescas
tem dança e bate cabeça
tem beijo na boca ou afago na bochecha
tem banho, tem água fresca
tem descanso 
finalmente tem descanso
sim senhor... tem descanso
tem gente sentada junto na janta 
pão partilhado, vinho ou cana
e até cigarro, se for lá fora
aqui tem olho no olho
aqui tem sorrisos ao redor da mesa

casa erguida com o suor sagrado
aqui o soldo é salgado
aqui trabalha o trabalhador cooperado
social consciente nas correrias astrais
então vem com o pai
passar frio e fome nas sombras nunca mais

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